Questão da saúde alimentar deve ser abordada em seus aspectos físico, psicológico e também comunitário
Por Evan Carvalho, Mirela Costa, Natalia Nogueira, Nicolas Dalmolim, Nicolle Martins e Pedro Morani
Reprodução: Sergio Amaral/MDS
O brasileiro tem consumido mais alimentos ultraprocessados. Isto tem impactado a saúde nutricional em dois sentidos. O primeiro é o aumento da obesidade e, com ela, problemas de saúde como diabetes e doenças cardiovasculares. Outro é a alta taxa de subnutrição. Este problema se soma ao agravamento da fome e a escalada de preços de hortaliças.
Na medida em que grandes redes de alimentos majoritariamente industrializados se impuseram em detrimento da alimentação in natura, o padrão de consumo dos brasileiros sofreu alterações. Enquanto alimentos de preparo prático – ricos em açúcar, sal e gordura – se mostram como alternativas mais viáveis economicamente à população, dietas saudáveis e nutritivas são cada vez menos acessíveis. De acordo com o relatório da Unicef intitulado “Situação Mundial da Infância 2019: Crianças, alimentação e nutrição”, pelo menos uma em cada três crianças com menos de 5 anos está desnutrida ou com sobrepeso no mundo. Por efeito da alta do desemprego e da inflação durante o período da pandemia de Covid-19, os indicadores de má alimentação tendem a ser ainda mais preocupantes.
O nutricionista Vinicius Sampaio Brandão, que também é mestre em Saúde, Ambiente e Trabalho, aponta que os elevados impostos sobre os alimentos são barreiras para o vasto alcance da alimentação saudável. Além disso, o profissional dá ênfase para a forma como a ausência de uma ampla política de educação alimentar, sobretudo nas escolas, é um dos principais fatores precursores do quadro nutricional precarizado no Brasil. Segundo o especialista, o contato de crianças e adolescentes com o processo de produção dos alimentos, bem como com o preparo daquilo que consomem, pode trazer impactos positivos referentes às mudanças de hábitos alimentares e de estilo de vida.
Reprodução: Janine Moraes/PMC
Embora a facilitação do acesso aos alimentos e a conscientização sejam pontos centrais a serem discutidos diante da nutrição irregular, a população mais carente encontra obstáculos para o atendimento nutricional, uma vez que esse tipo de acompanhamento é visto como secundário diante dos diversos gastos básicos, que encarecem a cada dia.
Amélia Madureira, dona de casa que mora na região oeste de São Paulo, diz que busca proporcionar para si e para a família uma boa alimentação, mas nem sempre sobra dinheiro. “Em alguns meses tem promoções nos mercados do meu bairro e isso deixa as coisas mais fáceis, mas quando vejo que tenho que esperar mais um pouco para comprar mistura, tenho que me virar com o que eu posso, como se eu fosse Jesus, transformando o peixe em vários pedaços.”
Vinicius reforça que a nutrição deve ser tratada de forma social e que, quando se fala em política de nutrição, o foco não deve recair somente sobre o ato de comer, e sim na qualidade e frequência dessa alimentação, além de fatores como renda e saneamento básico. Dessa forma, é importante que o profissional de nutrição traga consigo uma certa consciência em relação ao paciente que atende. “Eu já atendi pacientes que traziam tantas demandas que o menor dos problemas era a nutrição", ele relata. Apesar disso, o nutricionista também destaca que o Brasil carece de uma discussão social, o que pode afastar profissionais do que seria ideal.
Para Amélia, a ida ao nutricionista não cabe em sua realidade econômica. "Sei que não vou poder seguir a dieta que ele (nutricionista) vai me passar, eles não vão ver a minha realidade e pobre só passa em médico quando está doente”. Vinicius também enfatiza essa tendência e a relaciona com o que ele chama de histórico brasileiro medicocêntrico e assistencialista, que prioriza o atendimento feito por médicos e a detecção e cuidado de doenças já existentes.
“Geralmente, as pessoas só buscam um médico quando estão com sintomas, quando o problema está instalado. Isso é reflexo da condução da política nacional de saúde, que é centrada na figura do médico.”
Vinicius Sampaio Brandão, nutricionista. [Reprodução: Arquivo pessoal]
Para ele, uma possível solução para essa questão está na realização de programas que incentivam a prática de exercícios físicos, de assistência psicológica da população e de educação alimentar, tendo em vista que esses campos devem ser trabalhados com base na prevenção.
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