Para além do entretenimento, o Role-Playing Game é ferramenta educativa e de reconhecimento do território nas periferias do Brasil
Alessandra Ueno e Mariana Rossi
[Imagem: Reprodução/ Unsplash]
Os jogadores interpretam personagens, o mestre controla o sistema de regras e as situações que aparecem no decorrer da história: esse é o Role-Playing Game ou, como é mais conhecido, RPG.
Sua origem data de 1974, com a criação do sistema Dungeons & Dragons (D&D): “Ele não é tão antigo, mas também não é tão recente. Ele nasceu nos Estados Unidos, então, para vir para o Brasil, geralmente quem trazia era a ‘geração xerox’, que ia para o exterior, pegava os livros em inglês e tirava cópias. A gente tinha que aprender a traduzir, não existiam editoras nacionais, que fazem tradução ou até que criam sistemas,como existem hoje”, comenta Maurício Borges, que jogava quando era mais novo.
A popularidade do RPG é muito maior agora do que era antigamente e o que possibilitou isso foi a internet. Mas, as escolas e os projetos continuam com um papel fundamental no aumento do alcance dessa atividade, sobretudo nas periferias. “Eu odiava ir à escola e comecei a querer ir só para jogar RPG, porque era o único lugar em que eu tinha acesso a essa ferramenta. Naquele momento, eu não tinha me dado conta que foi o RPG que me ajudou a me manter engajado nos meus próprios sonhos. Essa vontade de contar histórias e desenhar, de escrever, sempre esteve comigo, mas ela não era nutrida por causa da realidade em que eu vivia”, conta Tchelo Andrade, que teve o primeiro contato com o RPG na escola.
O RPG é uma atividade que estimula a criatividade, a adaptação e a imaginação e os cenários para isso são os mais diversos possíveis. A cultura do RPG é muito famosa na América do Norte e na Europa, por isso, muitos dos conteúdos dos universos mais famosos remetem à cultura deles. Mas, existem iniciativas brasileiras focadas em aproximar os moradores das comunidades onde elas atuam com a história brasileira e com os locais que eles conhecem: “Dá para construir um jogo a partir da própria experiência do participante. Então a referência dele é uma pista de skate, uma pessoa do bairro. Dessa forma, enquanto se divertem, brincam e jogam, as crianças vão se aproximando da sua própria cultura”, explica o criador da Fundação Triunfo.
Por suas características e ludicidade, o RPG vai muito além do entretenimento. “A missão do nosso coletivo, até hoje, é levar o RPG como ferramenta socioeducativa, principalmente para as periferias”, conta Maurício, que foi de jogador a um dos fundadores do coletivo RPG & Cultura (@rpgcultura). A iniciativa, criada em 2009 a partir de um edital para a Secretaria de Cultura, foi ampliando sua atuação. Hoje, o coletivo leva o jogo para escolas, centros de crianças e adolescentes e Casas de Cultura.
Evento realizado pelo projeto RPG & Cultura em comemoração do Dia Nacional do RPG, que é dia 24 de fevereiro. [Imagem: Reprodução/ @rpgcultura]
No início, o grupo usava o RPG como uma ferramenta para contar histórias, como a Guerra de Canudos ou a Segunda Guerra Mundial, mas com o passar dos anos, perceberam que ele é mais do que isso. “O RPG, por excelência, é cultural e educativo, mesmo que ele trabalhe no imaginário, que esteja distante do mundo real, porque no imaginário a gente elabora questões do cotidiano”.
Para aproximar as crianças da periferia de seus sonhos — ou para potencializar os indivíduos, como gosta de dizer —, Tchelo Andrade, que hoje é o criador da Fundação Triunfo (@fundacao.triunfo), desenvolveu o Fundação Triunfo RPG, que além de poder ser usado gratuitamente na internet, é aplicado em escolas na periferia de Piracicaba (SP).
O estalo para criar a iniciativa ocorreu em 2018, após Tchelo finalizar uma oficina de quadrinhos com adolescentes da Fundação Casa. Tendo crescido em uma região de violência, ele percebeu que o que o manteve na escola foi o RPG. “E a vontade de jogar RPG começou a me ajudar também na própria escola. Como o jogo é baseado na cultura, na história, nas artes, eu ia para a escola, jogava e perguntava para os professores sobre a era medieval, as artes, os cálculos que tínhamos que fazer”, conta.
A Fundação Triunfo realizou uma oficina de RPG na Biblioteca de Piracicaba. [Imagem: Reprodução/ @fundacao.triunfo]
Além do jogo com a metodologia, o Fundação Triunfo RPG faz um enfrentamento da violência, pois os participantes são convidados a resolver os problemas por meios não violentos, e tem o intuito de apresentar a cultura local para as crianças e jovens.
A Fundação Triunfo disponibiliza um Kit inicial de RPG para aqueles que estão começando agora nesse mundo! Basta acessar esse link: https://fundacaotriunfo.wixsite.com/meusite; e colocar seu nome e e-mail. O projeto RPG & Cultura estará presente no Sesc Interlagos, nos dias 26 e 27 de novembro, para o evento Nerdcon 2022, que reúne diversos conteúdos da famosa cultura nerd — como RPG, BoardGame, Swordplay e Oficina de Miniaturas — de forma acessível. Para saber mais, fique ligado no perfil do @rpgcultura no Instagram!
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